sábado, 31 de agosto de 2013

AS MORTES DOS NOVOS INOCENTES

Quando Obama foi à Alemanha (em sua primeira campanha presidencial) para demonstrar que tinha traquejo internacional, e toda aquela multidão o acolheu como se fosse um herói... fiquei me perguntando "o que faz um povo inteligente como o alemão, idolatrando o cara como se ele fosse o salvador do mundo?". Era mais que óbvio que Obama estava pleiteando a presidência pra cuidar do seu quintal, da economia dos USA. O fato de cometer o mesmo crasso erro do Bush me leva a crer que o sujeito é outro pau mandado dos Senhores da Guerra. E nós seremos mais uma vez obrigados a assistir de camarote o assassinato ao vivo de milhares de pessoas. Jornalistas de todo o mundo ficarão a postos num prédio previamente selecionado pelas forças americanas para filmar tudo e faturar bilhões de dólares vendendo as imagens das mortes dos novos inocentes.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

DESREGRADOS

As pessoas instalam as regras, e as regras tornam-se sagradas. Não porque sejam as mais certas e necessárias, mas porque tudo que foi estabelecido parece impossível de se mudar, como aquelas "porcas" de metal que enferrujam em torno do parafuso e depois não querem sair. Só se soltam à base de marteladas, bem o sabem os mecânicos. 
Você pensa que vive num mundo onde ocorrem muitas revoluções por minuto, tudo muda o tempo todo, as cores, as formas, a moda, enfim. Mas nas profundezas do nosso sistema, tudo está como sempre foi. Estamos emperrados, empedrados, paralisados num tempo em que se adora os reis (do dinheiro, do futebol, da moda), em que se despreza e se pisa os fracos, em que se violenta e se machuca os pequeninos. Para os modernos homens brutos, toda delicadeza é "viadagem", toda sensibilidade é sinal de fraqueza, todo gesto polido é uma temeridade. Nunca fomos tão machistas, tão racistas e preconceituosos como nos dias que correm. A televisão manda comprar, acreditamos que é essa a regra moderna, então compramos todos esses belos produtos das vitrines como se fossem a salvação, e depois eles são jogados num canto, inutilizados em forma de lixo.
Saia pra fora, respire, vá caminhar no meio do mato, onde não existem regras. Observe os bichos, vivem sem leis e não se sabe de um deles que tenha morrido de estresse — pelo menos, enquanto não caiu nas mãos humanas. Dê uma olhada numa loja veterinária, todos aqueles pássaros engaiolados. São uma beleza a ser levada pra casa, ou são o símbolo da aflição humana? Nós engaiolamos peixes, tigres, pássaros, pessoas, sentimentos! Dá uma olhada numa Câmara Municipal, aqueles homens cheios de regras. O que fazem com suas sagradas leis, senão perpetuar a incoerência, a estática, o tédio? É preciso romper a regra, deixar voar os pássaros, soltar mais uma vez o velho grito de liberdade, esse pássaro raro que cresceu nas profundezas de nossas almas oprimidas...

terça-feira, 27 de agosto de 2013

VOCÊ SABE?

A vida comum, regrada, dentro da lei, tem suas vantagens, e a maior delas é o conforto. E o prazer, para aqueles que conhecem os meios da sua fruição. Posso passar a vida seguindo essa linha reta, sem solavancos, sem abismos e penhascos, um caminho de delicadas colinas e inclinações suaves, rumo ao fim!
Eu não arrisco nada fora do riscado, não me levanto contra as opressões, não me revolto contra os pequenos ditadores que encarceram minha vida. E aqueles que arriscam sair desse riscado, evadir-se do leito confortável desse rio de águas mornas, aqueles são os temerários aventureiros que temo, que julgo e condeno. Mas no fundo sei que eles sabem coisas que eu não sei.

Tem coisas que o cego sabe que eu não sei. Tem coisas que o velho sabe que eu não sei. Tem coisas que o surdo sabe que eu não sei. Tem coisas que o aleijado sabe que eu não sei. Tem coisas que o cubano sabe que eu não sei. Tem coisas que o drogado sabe que eu não sei. Tem coisas que a mãe solteira sabe que eu não sei. Tem coisas que o índio sabe que eu não sei. Tem coisas que o pirata sabe que eu não sei. Tem coisas que o pecador sabe que eu não sei. Tem coisas que o favelado sabe que eu não sei. Tem coisas que o homossexual sabe que eu não sei. Tem coisas que a prostituta sabe que eu não sei. Tem coisas que o animal silvestre sabe que eu não sei. Tem coisas que o aluno reprovado sabe que eu não sei. Tem coisas que o aluno negro sabe que eu não sei. Tem coisas que condenado à morte sabe que eu não sei. Tem coisas que o náufrago sabe que eu não sei. Mas todas as coisas que eu não sei, o Tempo sabe. E a sabedoria do Tempo é tamanha que até o futuro ele sabe, pois ele é a única coisa deste mundo que existe também no futuro. O Tempo não existe, é invenção humana, mas então, o que é mesmo que eu sei?

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

terça-feira, 13 de agosto de 2013

O GÓTICO

Chegamos da escola, antes de descer do carro Julian faz uma cara de mau, cruza os braços e recusa-se a sair.
— Vou ficar aqui!
— O que foi, filho?
— Pai, você não ta entendendo. Eu quero ser gótico!
— Gótico? Por que, filho?
— Agora, sempre que eu sair pra algum lugar, eu quero ir de roupa preta. Não quero mais roupa clara, como esta do uniforme.
— Isso é ser gótico?
— É!
— Tudo bem, se você quiser... vamos ver se você tem alguma roupa preta pra se vestir de gótico.
— Tô brincando, pai! É tudo mentira!
Dizendo isso abre um sorriso, abre a porta do carro e sai correndo, deixando um rastro de cores e luzes por onde passa.

CAMINHAR

Num tempo remoto as pessoas saíam caminhar

quando queriam ir a algum lugar.

Hoje elas caminham quando querem se cansar

e cansadas sempre voltam ao mesmo lugar.

Naquele tempo remoto,

o maior objetivo do dia

era descansar!

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

GENTE SOFISTICADA

É visível em todo tempo e lugar um grupo de pessoas que se acham escolhidas pelo destino para ser "elite". Cultivam suas qualidades, o que é louvável, mas apresentam ao público como prova de que participam de um pequeno rol de privilegiados. Discutem com grande propriedade os assuntos considerados culturais, que podem variar entre um velho disco de Edith Piaf, uma litogravura de Escher ou a última teoria sobre o mercado imobiliário. E quando olham para a periferia (não somente a favela, mas todo aquele bando de gente grosseira que não entende nada dessas coisas finas das pessoas culturais), essas pessoas culturais têm a certeza de que aquelas outras pessoas foram construídas com um material de terceira e não merecem nada mais que permanecer em suas choças mentais. 
Essas pessoas da Primeira Classe não percebem e não perceberão que seu olhar sobre os considerados seres inferiores constitui em si mesmo uma deficiência grave, que os põe numa condição de fragilidade, a qual poderá arrebentar ao menor sinal de força contrária. E o motivo é simples: baseia-se num equívoco. Pois todas as criaturas, seja um Nobel da Física ou um rato de esgoto, são construções de altíssima sofisticação. Mesmo o caboclo que mora nos fundos do sertão cumpre um ciclo de vida extremamente complexo, que ele próprio percebe em alguns instantes de rara clarividência, especialmente quando começa a intuir a aproximação de sua própria morte. Talvez a arrumadeira de camas do hotel não tenha grandes estudos para saber dos novos conceitos de realidade, mas ela certamente detém um conhecimento bastante profundo sobre as origens da sua própria dor, ou dos seus desejos inconfessados, ou dos prazeres que desfruta às escondidas da sociedade que a classifica como um ser inferior, ou, no máximo, de qualidade mediana.
A realidade mundana é extensa, grandiosa e soberana sobre os nossos processos mentais. Queiramos ou não, o ser humano é um pequeno detalhe num universo grandioso. Queremos deter toda a gama de conhecimento disponível em nosso entorno, para mostrar o quanto somos especiais, mas o maior sábio de todos os tempos, o Senhor Tempo, vem para desfazer todos os equívocos. E ele nos mostra que todos os narizes empinados caíram, e todo o seu orgulho foi por terra, dissolveu-se, desapareceu. E já faz tempo que o mais simples dos mortais deu-se conta que, ao final de tudo, Dona Morte encarrega-se de aplainar todas as diferenças.
Você pode acreditar que se encontra num grupinho de gente fina, cada um com um papo mais legal que o outro. Mas quando você chega em casa, a verdade da sua vida é você e o seu rosto no espelho. O que você vê?