segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Documento encaminhado ao presidente do Instituto Ambiental do Paraná, neste dia 20 de agosto de 2012, e que deverá ser transformado numa Ação Civil Pública contra a degradação das Cachoeiras Gigantes de Prudentópolis-PR.

Por que não devemos construir
PCHs em Prudentópolis

Ainda que a geração hidrelétrica seja sustentável, algumas regiões atingidas para que ela fosse gerada tiveram, em lugar de desenvolvimento, retrocesso insustentável. (Müller, 1995, citado no EIA-RIMA Dois Saltos)

Projetos de implantação de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) no município de Prudentópolis-PR vêm sendo mencionados em reuniões públicas, desde 2011. A de maior impacto, respectiva ao projeto Dois Saltos, pretendida pelas empresas Copel e Santa Clara, numa área que abrange os saltos Manduri e Visconde do Rio Banco, requer uma ampla discussão na esfera pública, antes que seja autorizada sua implantação. Infelizmente, isso não vem sendo feito. As explanações técnicas apresentadas até o momento são parciais e a divulgação é deficiente. A população de Prudentópolis continua sem saber, exatamente, do que se trata.

O projeto Dois Saltos prevê a construção de um túnel e de uma usina no leito e no entorno do Rio dos Patos. Conforme o próprio EIA-RIMA do projeto, “as obras hidrelétricas (...) produzem grandes impactos sobre o meio ambiente, que são verificados ao longo e além do tempo de vida do empreendimento e do projeto, bem como ao longo do espaço físico envolvido”. Somente este fato deveria ser suficiente para tomarmos os mais extremos cuidados, ao atentar contra o patrimônio natural de Prudentópolis. Mas há questões igualmente importantes, que devem ser analisadas à luz da sabedoria, antes que da insana sede por energia e por faturamento monetário.

Neste documento demonstramos que o projeto apresenta uma série de deficiências e inconformidades, tanto em relação às normas, quanto ao valor técnico do Estudo de Impacto Ambiental - EIA. A argumentação também baseia-se no fato de que as questões ambientais não estão dissociadas de outros temas de interesse público, como a economia, representada pelo nascente turismo no município, com consequentes repercussões na área social. Evidencia-se que a obra trará prejuízos a esses diversos setores.

Nas páginas seguintes listamos os pontos conflitantes contidos no EIA, com fins de contestação de seu valor documental e de indicação para a não aprovação do licenciamento ambiental do empreendimento Dois Saltos.

A argumentação abrange os seguintes tópicos:

1 – O Estudo de Impacto Ambiental apresenta falhas de concepção e estrutura.
2 – Projetos de usinas nos rios de Prudentópolis pressupõem a execução de estudos científicos profundos sobre as singularidades do município no cenário paranaense.
3 – As questões ambientais não podem ser dissociadas de outros temas, visto que estes representam um conjunto complexo de potencialidades e carências.
4 – A beleza maior das cachoeiras esconde-se sob um histórico de degradação cênica.
5 – Falta informações à população do município.
6 – É evidente o baixo retorno econômico para o município e sua população.
7 – O impacto ambiental trará repercussões negativas no turismo do município.
8 – A região abrangida pelo projeto é habitat de felinos de grande porte.
9 – As restrições na produção agrícola das áreas afetadas pelo projeto Dois Saltos trarão prejuízos ao município.

1 – O Estudo de Impacto Ambiental apresenta falhas de concepção e estrutura

A falta de aprofundamento apresentado pelo EIA-RIMA do projeto Dois Saltos evidencia-se desde o início, quando se refere ao Salto Barão do Rio Branco. Como veremos em seguida, o verdadeiro nome é Salto Visconde do Rio Branco, nomeado por Alfredo d’Escragnole Taunay, o Visconde de Taunay, presidente da Província do Paraná, no final do século XIX. Citamos o fato somente para destacar a qualidade do estudo, que aponta para outras questões, sendo estas realmente graves.

Das normas que regem o processo de licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, consta a Resolução do CONAMA nº 1, de 23 de janeiro de 1986, que dispõe sobre os critérios para a avaliação de impacto ambiental, exigindo em seu artigo nº 2 a elaboração do EIA. No artigo 5º, Inciso I, consta que o estudo deve “contemplar todas as alternativas tecnológicas e de localização do projeto, confrontando-as com a hipótese de não execução”, e insiste no fato de que deve ocorrer “a caracterização da qualidade ambiental futura da área de influência, comparando as diferentes situações de adoção do projeto e suas alternativas, bem como a hipótese de sua não realização”. Entretanto, em nenhum momento a hipótese de não execução foi mencionada no EIA do projeto Dois Saltos. Pelo contrário, o texto busca insinuar que a execução da obra é certa e irreversível. E mais, tenta desqualificar as alternativas tecnológicas menos impactantes para a geração de energia, como a solar e a biodigestão de resíduos, alegando que não se aplicam à discussão. A energia eólica foi considerada fora do contexto em discussão .

O estudo deveria apontar o fato de que Prudentópolis produz um grande volume de resíduos, oriundos da atividade pecuária, e que não são devidamente tratados. O lixo orgânico coletado na cidade é encaminhado para um “lixão”, quando poderia ser conduzido a um biodigestor. A própria Copel possui projetos de reaproveitamento de resíduos como esses, em parceria com produtores rurais de suínos e bovinos. Além de proporcionar a captação de energia e retorno econômico, o resíduo da pecuária e o lixo urbano podem resultar em excedentes que são reaproveitados como fertilizantes de solo, auxiliando na resolução da poluição ambiental. Como vemos, o município possui alternativas — ambientalmente corretas —às PCHs, mas isso não é citado no EIA-RIMA. Considerando a carência energética regional, poderia mencionar as energias solar e eólica, que podem bem ser produzidas inclusive em locais restritos, como as propriedades rurais.
 
O estudo foi apressado e não minucioso. Furtou-se, por exemplo, de realizar uma análise minuciosa das espécies indicadoras de qualidade ambiental e das ameaçadas de extinção. O tempo de pesquisa sobre fauna e flora absurdamente curto — 4 dias para a flora; 3 para mamíferos; 3 para aves; 2 para répteis e anfíbios e nenhum para peixes e invertebrados — o que demonstra a pressa em fazer aprovar o projeto. Tal fato fica demonstrado na não detecção, pelo EIA, de um bivalve límnico muito comum em todo o leito do Rio dos Patos, conhecido popularmente como “conchinha de rio”, (provavelmente família Hyriidae). Espécies como essa são indicadoras de qualidade ambiental e são seriamente ameaçadas pela destruição e modificação da dinâmica hídrica (lótica e lêntica), causadas pela instalação de barragens, canalização e alteração na profundidade da água, no fluxo ou na deposição de partículas. O Livro Vermelho das espécies ameaçadas do Paraná classifica todos os bivalves dulcícolas como ameaçados, devido justamente às barragens e aos desvios de vazão.

É de se estranhar que o Estudo de Impacto Ambiental dê tão pouca importância à biodiversidade ora presente no local. E é sinistro o fato de que, num empreendimento cujo maior impacto se dará sobre o ambiente aquático, os dados sobre invertebrados aquáticos simplesmente não existam, e os dados sobre peixes sejam baseados somente em bibliografia.

Dentre as espécies levantadas, nota-se a inacreditável inexistência de espécies comumente encontradas na região, e que coincidentemente encontram-se ameaçadas de extinção, como a paca e alguns felinos. Também há algumas espécies listadas como não ameaçadas, quando na verdade constam nos estudos científicos como ameaçadas, como a lontra e o morcego chropterus auritus — este classificado pelo EIA como LC, porém ele consta no Livro Vermelho como VU. No caso da lontra, a modificação do ambiente aquático irá impactá-la diretamente.

Em relação a certo grupo de animais, o EIA admite que a pesquisa baseou-se em “literatura e distribuição geográfica potencial, segundo análise museológica”. O estudo também afirma que “o último registro de felino é do início da década passada”. No entanto, relatos atuais de moradores (ver nas páginas a seguir) atestam que felinos de médio e grande porte são muito presentes na região. Ao referir-se à jaguatirica, por exemplo, o EIA tenta indicar que os exemplares existentes são “remanescentes de populações que ocupavam a região anteriormente”, com o expresso objetivo de desqualificar o animal como habitante legítimo da área na atualidade.

Um dos principais impactos recai sobre o fitoplâncton, com a diminuição da diversidade das espécies. Como se trata da base da cadeia alimentar, irá causar alterações em toda a pirâmide, alterando o equilíbrio ecológico local. Pouca análise se faz nesse quesito e procurou-se classificar o impacto como de menor importância.

O EIA Dois Saltos também informa que “os impactos mais relevantes da instalação de uma pequena central hidrelétrica no local proposto sobre a avifauna estarão relacionados à supressão da vegetação ciliar na área prevista para as estruturas do empreendimento. A formação florestal remanescente mais importante para a avifauna local coincide com a área prevista para a supressão”, onde ficará o lago de regularização. Isto significa que a área mais rica para a vivência e procriação das aves na região será tomada pelas obras da usina.

O estudo demonstra que o túnel sugerido no projeto “irá atravessar rochas de naturezas diferentes separadas por contatos geológicos não conformes (...)” e que as obras poderão “causar instabilidades nos maciços rochosos no período inicial da operação”, isto é, as explosões para abertura da vala onde será construído o túnel poderão produzir abalos sísmicos que impactarão a estrutura do terreno no entorno. O relatório comenta o que “seria” necessário fazer para evitar os danos, mas não afirma que tais ações serão levadas a termo. Na última audiência pública respectiva ao projeto Dois Saltos os técnicos informaram que a abertura do canal e do túnel, seria realizada por máquinas perfuratrizes e não por explosivos.

Ressalta-se o fato de que a obra pretendida pelo projeto Dois Saltos não objetiva a implantação de uma estrutura visando a elevação econômica e social da comunidade, porém tão somente o faturamento monetário das empresas envolvidas, com o ônus da biodiversidade e da qualidade de vida do município. Ora, se fosse o contrário, o estudo daria grande ênfase à possibilidade de “não execução”, considerando-se que esta poderia ser a opção mais desejável. Obviamente empreendimentos ambientalmente corretos, como os citados para a captação de energia, trariam lucratividade bem menor às empresas envolvidas, porém o ganho social, ambiental e econômico da comunidade seria mais desejável do que a justificativa apresentada na página 511 do EIA (“Aumento de Receitas Públicas”).

No que concerne às cachoeiras Manduri e Visconde do Rio Branco, objetos do projeto Dois Saltos, o EIA não apresenta um estudo aprofundado sobre suas características naturais, que foram drasticamente afetadas pelas usinas já instaladas.

Grande parte do texto do EIA parece ter sido copiado de outros projetos, o que evidencia a pouca iniciativa de pesquisa das características naturais e culturais da área pretendida e do seu entorno. Não há referências, por exemplo, às estatísticas de vazão d’água a longo prazo, o que seria absolutamente necessário na fixação de metas a serem cumpridas pelo projeto quando implantado, no que se refere à vazão mínima prevista pela Lei. Um estudo mais elaborado certamente mostraria que a vazão dos rios de Prudentópolis diminuiu drasticamente nas últimas décadas, em função do acelerado desmatamento da região. Muitas fontes desapareceram, riachos secaram. Tal realidade aponta para a iniciativa de recuperação das nascentes, dos riachos e dos rios, o que traria de volta grande parte do ambiente natural, e também devolveria às cachoeiras a sua média de vazão inicial. Entretanto, se avaliarmos a vazão sob as estatísticas dos últimos dez anos, obrigatoriamente obteremos uma vazão mínima muito menor que a média histórica, quando os rios de Prudentópolis escoavam suas águas com plena capacidade. Ao afirmar que manterão a vazão mínima das cachoeiras, no entanto, as empresas proponentes não apontam um demonstrativo da vazão histórica (ao longo de várias décadas), e sim a dos últimos anos, o que significa uma porcentagem muito maior de água escoando para as tubulações da usina do que seria num cenário natural recuperado. Somando-se a isso, os técnicos das empresas afirmaram em reunião pública que o escoamento da água no Salto Manduri seria “readequado”, a fim de que a água se espalhasse, caindo de forma regular e abrangendo todo o paredão rochoso, mantendo assim o visual de uma cachoeira com água. O projeto idealiza “compensar o impacto referente à alteração do cenário paisagístico” modificando a “estrutura da barragem existente com o intuito de distribuir o volume de água vertido sobre toda a largura da cachoeira”. Com isso, fica evidente o objetivo de fazer parecer que está caindo água, segundo manifestou um cidadão prudentopolitano durante uma das reuniões públicas.

Os representantes daquelas empresas afirmam que a vazão das cachoeiras não diminuirá, em outros momentos dizem que até mesmo aumentará. Porém, o EIA respectivo contradiz aquele discurso.

As afirmações a seguir, contidas no EIA, causam estranheza, se comparadas com o discurso dos representantes das empresas proponentes, quando afirmaram nas reuniões públicas a ocorrência de baixo impacto ambiental: “Com a implantação do Empreendimento Dois Saltos, observa-se que haverá diminuição significativa na magnitude das vazões (...) em cerca de 40% do tempo sobre o Salto Manduri, e em cerca de 60% do tempo sobre o Salto Barão do Rio Branco, gerando um impacto negativo. (...) Com o aumento do período de ocorrência de valores baixos de vazão após a implantação do empreendimento Dois Saltos, o impacto aqui analisado toma uma dimensão diferenciada, visto que um dos pontos de valorização do Recanto Rickli é a contemplação do Salto Manduri. (...) O impacto da alteração do cenário paisagístico em determinados períodos no trecho de vazão reduzida ocorrerá na fase de operação, sendo de natureza negativa, com manifestação direta. A probabilidade de ocorrência é certa. (...) A magnitude e a importância do impacto são altas, sendo um impacto irreversível. (...) Esse efeito se intensifica em fragmentos pequenos e isolados e pode em algumas vezes ser irreversível e acabar por condenar todo o remanescente”.

Acrescente-se que o EIA, e também os técnicos durante as Audiências públicas, buscaram demonstrar que não haverá novo represamento. Segundo o EIA, o projeto não prevê “um represamento do Rio dos Patos além daquele já existente e que será simplesmente aproveitado”. Porém, o lago de regularização, apontado no projeto, o que é, senão uma represa? Sem contar o fato de que na área destinada ao lago encontra-se a porção de floresta ombrófila mista em melhor estado de conservação, que nesse espaço será definitivamente extraída.

Percebe-se que as contradições são extensas e profundas. Não se pode falar em “medidas mitigatórias’, portanto, se não há estudo elaborado e objetivo, através do qual possamos saber o que Prudentópolis, sua população e os visitantes de todo o mundo estão prestes a perder.
 
Um promotor de Justiça de Maringá, que acompanha as reuniões públicas respectivas às PCHs, apontou todos os problemas que seriam criados pelo projeto Dois Saltos. Ao demonstrar os prejuízos ambientais, diretamente no rio e no seu entorno, o promotor concluiu: “Todos os benefícios serão temporários, e todos os problemas serão permanentes”. Os representantes das empresas interessadas na construção da usina não apresentaram nenhum argumento contra as palavras do promotor, deixando bem claro que a verdade estava na voz daquele funcionário da Justiça, não na dos proponentes.

Por outro lado, as medidas mitigatórias sugeridas no EIA não encontram correspondência no histórico de atuação das duas empresas proponentes, no decorrer das últimas décadas, junto às represas das quais extraem energia ou em qualquer local do município de Prudentópolis. Não houve uma única ação dessas empresas que possa justificar o empenho futuro no cumprimento das promessas que agora apresentam — ao propor a realização de um projeto mais lucrativo do que a soma dos já instalados. A Copel elevou a represa do Salto Manduri sem consulta pública. E a Santa Clara mantém uma estrutura muito precária junto ao Salto Visconde do Rio Branco, embora o local seja visitado há décadas pelo público.

Sabe-se que as PCHs instaladas no Rio dos Patos não cumprem vazão sanitária, tampouco se tem notícias sobre a gestão ambiental das mesmas. Como o projeto Dois Saltos trata-se somente da ampliação dos projetos já instalados, é de se perguntar se os programas mitigatórios prometidos serão cumpridos.

O Estatuto das Cidades (Lei nº 10.257/01) prevê a preservação e recuperação do ambiente natural, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico. Ora, as cachoeiras de Prudentópolis são seu patrimônio natural mais aparente e mais divulgado. São o cartão de visita do município e o principal motivo de sua divulgação em mídias de alcance nacional. E a Lei Orgânica municipal, em seu Artigo 230, prevê que “O Município assegurará a preservação das matas ciliares dos mananciais de água”. O projeto de instalação de novas usinas nessas cachoeiras, portanto, vem no sentido inverso das determinações legais, na forma de um verdadeiro atentado contra essas riquezas municipais.

Acrescente-se que o artigo 57 do Plano Diretor Municipal – PDM de Prudentópolis, institui o Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança “como instrumento de análise para subsidiar o licenciamento de empreendimentos (...) que possam causar impactos ao meio ambiente. Mas não há estudo algum, realizado pelo Executivo Municipal, relativo ao projeto Dois Saltos, e também não há referência no EIA sobre a necessidade desse estudo pelo Município.

Esse EIA, que poderia ser utilizado como um documento de validade científica para posteriores estudos da região, infelizmente fica invalidado, devido à escassez de trabalhos e levantamentos biológicos, demandando um estudo mais prolongado e minucioso.

Algumas espécies ameaçadas de extinção, presentes da área do projeto Dois Saltos

Jaguatirica, gato do mato, onça-pintada ou parda, veado mateiro, bugio, lontra, gavião pega macaco, grimpeiro, rã de vidro, suçuarana, paca, jacarandá, araucária, imbuia, canela sassafrás e xaxim-bugio. Na área almejada pelas proponentes do projeto Dois Saltos também encontram-se sapos, lagartos, ostras, peixes, borboletas e centenas de outras espécies animais e vegetais, que terão seu ambiente natural adulterado.

2 – Projetos de usinas nos rios de Prudentópolis pressupõem a execução de estudos científicos profundos sobre as singularidades do município no cenário paranaense

A carência de um estudo científico sobre o município de Prudentópolis tem levado a julgamentos precipitados e equivocados quanto ao seu potencial turístico e energético. A tentativa de implantar novas usinas nos rios do município tem evidenciado a carência de informações de cunho científico, a falta de conhecimento da população sobre o tema e a má vontade dos proponentes em divulgar os mais amplos aspectos dessas questões.

Prudentópolis é o berço do Rio Ivaí, é o começo de uma vasta área que atinge grande parte do Centro e do Noroeste Paranaense. É imperativo atentarmos para o fato de que este é um município singularíssimo na estrutura geográfica paranaense, e que por isso merece cuidados especiais.

A área do município encontra-se em três patamares: 1 – o da Serra da Esperança, ao nível da cidade de Guarapuava; 2 – o nível médio, no qual situa-se a cidade de Prudentópolis e grande parte do território municipal; 3 – o nível baixo, onde se localiza o Vale do Rio Ivaí. Essa constituição em três níveis e a hidrografia abundante proporcionaram a formação de dezenas de cachoeiras. Algumas delas precipitam-se diretamente do nível 1 para o nível 3, como o Salto São Francisco, com 196 m, e os Saltos Gêmeos, com 120 e 130m. A hidrografia é representada por riachos que descem desde Guarapuava, Irati e Inácio Martins, somados aos que se formam em terras de Prudentópolis. Esses riachos se transformam em rios, que concorrem para a formação do grande Rio Ivaí.
 
Tal estrutura geográfica, com suas montanhas, morros, rios, cachoeiras e cavernas, além das características singulares de fauna e de flora, somam-se a uma estrutura agrária incomum, representada pelo Sistema Faxinal, que preserva suas próprias áreas florestais nativas. Prudentópolis tem mais da metade de sua população residente no meio rural, e suas colônias já foram tema de reportagens em programas de abrangência nacional, devido à diversidade de suas atividades econômicas e à riqueza de suas paisagens. Todas essas características somadas impõem a necessidade de um estudo científico amplo e rigoroso, a ser realizado por universidades, observando as realidades ambientais, as potencialidades econômicas e as demandas sociais. Tal estudo é essencial e impositivo, antes que se aprove a implantação de projetos de novas usinas, que poderão ter caráter definitivo e de grande prejuízo para a população presente e futura.

3 – As questões ambientais não podem ser dissociadas de outros temas, visto que estes representam um conjunto complexo de potencialidades e carências

A vida dos prudentopolitanos sempre esteve associada com a terra, a floresta, os rios e suas cachoeiras. Desde a grande colonização Europeia, no final do século XIX, e durante várias décadas, a Natureza permaneceu praticamente intocada. O governo federal havia feito uma reforma agrária, adquirindo grandes áreas de antigos proprietários e repassando-as em forma de pequenos lotes às mais de 8 mil famílias de ucranianos, poloneses e alemães que se instalaram em torno da pequena Vila de Prudentópolis. Até a década de 1970 praticava-se a agricultura de subsistência, com baixa degradação ambiental. Somente a partir da chegada das grandes máquinas agrícolas teve início o processo de desmatamento e o aumento do latifúndio, com o consequente êxodo rural. Ainda assim, grande parte da população reside na área agrícola, e mantém um vínculo intenso e precioso com a natureza circundante.

Nos últimos anos o turismo surgiu como alternativa econômica, que vem ao encontro dos anseios dos empresários, dos ecologistas, dos agentes culturais e dos trabalhadores em geral. Nesse contexto, a manutenção da floresta, a preservação dos rios e de suas cachoeiras, tornou-se uma necessidade pública, visando atrair visitantes que tragam riquezas aos habitantes da cidade e do interior.

O processo de conscientização quanto ao potencial turístico de Prudentópolis tem sido árduo e lento, mas já trouxe resultados reais. Vários hotéis, pousadas e restaurantes foram construídos nos últimos 15 anos. Formaram-se turmas de guias turísticos e cursos e palestras têm sido ministrados nas escolas locais com vistas ao conhecimento desse novo setor econômico. Os jovens estão aprendendo que a coisa mais básica e preciosa, no ramo turístico, é a preservação do ambiente natural e das tradições culturais. Preservação do meio ambiente, conservação e divulgação da cultura, crescimento econômico e equilíbrio social, portanto, são temas que caminham agregados, e não podem ser, de forma alguma, tratados em separado. Os projetos de instalação de usinas encontram-se obrigatoriamente nesse mesmo contexto.

4 – A beleza maior das cachoeiras esconde-se sob um histórico de degradação cênica

O Rio dos Patos possui cachoeiras desde suas nascentes, no povoado de Itapará, município de Irati-PR. Poucos quilômetros antes de juntar-se ao Rio São João para formar o Rio Ivaí, este rio caudaloso forma os saltos Rio dos Patos, Manduri e Visconde do Rio Branco. Estes configuram-se em verdadeiros espetáculos naturais. O Salto Manduri, com seus 34 metros de altura e aproximados 100 metros de largura, constitui-se num dos mais atraentes cenários de visitação do Estado do Paraná. E o Salto Visconde do Rio Branco é considerado uma das maiores catadupas do Brasil. O conjunto formado por essas cachoeiras seria de um esplendor ímpar no mapa do Paraná e no Brasil. Mas elas perderam parte de sua beleza cênica a partir da construção de obras de concreto, representadas por barragens, usinas hidrelétricas e fábricas de pasta. O que não significa que estamos autorizados a introduzir novas usinas, ou outras construções. Pelo contrário, como veremos adiante, o crescente setor turístico solicita ações em sentido contrário, com o objetivo de propiciar o retorno ao ambiente natural.
 
Um paredão de pedra seca
 
A represa e a usina do Salto Manduri foram implantadas na primeira década do século XX, para fornecimento de energia às cidades de Prudentópolis e Irati. Apesar disso, a extração da água da represa para a usina era pouca, e a cachoeira permanecia quase sempre com boa vazão. Durante décadas o “Recanto Rickli”, onde se encontra o Salto Manduri, foi local de intensa visitação pública.

Há pouco mais de uma década, no entanto, o Salto Manduri sofreu uma interferência brutal, com a elevação da barragem e o aumento da captação d’água pela usina. Tal obra foi realizada pela Copel, sem qualquer informação ao público. Resultou na destruição de grande parte da mata ciliar tocada pela água represada e no decréscimo significativo da água da cachoeira. Após essa interferência, bastam poucos dias de estiagem para que o Salto Manduri se transforme num paredão de pedra seca, com somente um filete d’água onde deveria haver uma cachoeira de beleza extraordinária. A visitação pública desse atrativo rareou nos últimos anos, apesar do aumento do número de turistas no município.

A degradação do Salto Visconde do Rio Branco

O Salto Visconde do Rio Branco foi nomeado pelo presidente da província do Paraná, Visconde de Taunay, que esteve no local em 10 de abril de 1886. Em 1899 ele publicou suas impressões sobre o salto no livro “Chorographia do Paraná”, do historiador Sebastião Paraná.

Difícil é, por certo, encontrar-se, até mesmo no Brazil, tão pródigo de formosas e variadíssimas curiosidades naturais, cousa mais bela, mais cheia de grandeza e selvática magneficencia. Imagine-se copiosíssima e límpida massa líquida, atirando-se de golpe em precipício de 75 a 80 metros de altura e pulando uma muralha cortada a pique, cuja linha da aresta superior, toda crivada de fundas reentrâncias e grandes saliências, imprime as mais pittorescas e encontradas direções às águas, no momento em que o rio inteiro, como que preza de fatal desespero, se jorra de um ímpeto no abysmo.

Por isso, os enormes e espumantes caixões ora formam larga e belíssima  curva toda riscada de rugas paralelas como crespos de ondeante cabelleira, ora cahem de subito em bloco, a modo de peso inerte e que só obedece à gravidade, ou então se dividem em rios e filetes, mais ou menos encorporados, parecendo, uns, alvíssimos fitões a riscarem de branco a pedra negra, outros, uma serie de aereos flocos, que não attingem o fundo, se desfazem em nevoeiro, se pulverizam nos ares e desvendam nos raios do sol os graciosos e leves ancenubios do arco-iris.

(...) Foi quando, voltando-me para os companheiros de excursão, exclamei com voz forte: “esta catadupa terá o nome de Salto Visconde do Rio Branco”. Então uma saudade funda e repassada de gratidão pungio o coração dos brazileiros que se achavam naquellas solidões; e todas as grandezas da natureza inconsciente, aquellas revoltas e estrondeantes águas, aquellas immensas rochas, aquelles solemnes e alentados madeiros, tudo se abateu e ficou pequeno ante a estatura moral do estadista, cuja recordação esse glorioso nome evocava no meio de invios sertões!

Essas expressões entusiásticas devem-se principalmente ao fato de que, naquele período, o salto possuía uma configuração muito diferente da atual. Em torno, havia uma floresta de altos pinheirais, e a cachoeira estendia-se por um largo paredão. A queda d’água dividia-se em várias cachoeiras de menor volume (“alvíssimos fitões”, segundo Taunay), que no entanto desapareceram após a construção da barragem, na década de 1950. E o Salto Visconde do Rio Branco, como o Manduri, perdeu muito de seu encanto natural.

Obra extemporânea

Considerando-se a proximidade dessas cachoeiras da cidade de Prudentópolis, e levando-se em conta a grandiosidade dos cenários que eles representam, são esses os atrativos naturais de maior potencial para a exploração do turismo no município. No entanto, as obras de concreto implantadas no entorno dessas cachoeiras ao longo dos anos degradou de tal forma os ambientes naturais, que acabaram se tornando locais pouco atraentes aos turistas.

Segundo o EIA do projeto Dois Saltos, “embora o acesso e o visual do salto (Manduri) sejam explorados de forma privada, é um dos poucos lugares de lazer em área acessível, e próximo a uma cachoeira, muito frequentado pela população local, turistas e visitantes de Prudentópolis”. Mas a realidade é que os visitantes do Recanto Rickli deslocam-se ao local mais para apreciar a comida do restaurante recém instalado do que para apreciar a cachoeira. Empresários do setor hoteleiro preferem direcionar seus hóspedes a pontos mais distantes da cidade, como os saltos São João e São Sebastião e Recanto Perehouski.

Por outro lado, considerando o crescente setor turístico de Prudentópolis e o alto faturamento econômico que as cachoeiras deverão proporcionar no médio e no longo prazo, prevê-se que em breve os agentes desse novo setor econômico estarão empenhados em retirar as usinas e fábricas existentes junto a essas belezas naturais. O faturamento municipal com o turismo deverá ultrapassar largamente os poucos recursos gerados com impostos, proporcionados pela usina em projeto. As obras previstas, portanto, tornam-se absolutamente inconvenientes ao projeto de desenvolvimento do município.

Degradação do cenário do Salto 7

Acrescente-se que nas encostas do cânion formado pelo Rio dos Patos, poucas centenas de metros abaixo do Salto Visconde do Rio Branco, destacam-se várias cachoeiras. Dentre elas está o Salto 7, um dos mais utilizados pelos turistas para a prática de rapel em Prudentópolis. Encontra-se num cenário natural completamente preservado da ação humana. É nas proximidades desse local que o projeto Dois Saltos prevê a construção da nova usina, à beira do Rio dos Patos. Será um ato destrutivo de grande perda para aquele ambiente natural e também para o turismo do município. O prazer do turista em descer por cordas num ambiente de aspecto selvagem será frustrado pela visão de uma construção de concreto no meio da mata.

5 – Falta informações à população do município

As empresas proponentes da PCH Dois Saltos nunca divulgaram dados concretos relativos às obras. Em reunião pública, afirmaram que uma pesquisa junto à população apontou mais de 70% de concordância em relação à construção da usina. Mas é evidente que a população foi apanhada de surpresa pelos supostos pesquisadores. Desavisados quanto aos impactos negativos, acreditando no velho conceito de que “usina é progresso”, talvez muitos tenham-se manifestado favoravelmente. Mas a verdade é que a maioria dos cidadãos prudentopolitanos não sabe exatamente do que se trata. Sem contar com o fato de que os meios de comunicação local nunca deram voz aos que discordam quanto à construção das PCHs. Após as reuniões, os únicos ouvidos pelas rádios e TV locais têm sido os técnicos das empresas solicitantes. Ainda deve-se atentar ao fato de que algumas pessoas foram entrevistadas duas vezes, e que outras integram a equipe da Lactec, empresa realizadora da pesquisa, levantando dúvidas sobre a isenção de seus comentários.

Observando objetivamente a iniciativa dessas empresas, percebemos que elas não proporcionaram ao povo de Prudentópolis a oportunidade de conhecer, para poder avaliar e julgar, de forma absolutamente consciente e isenta, todo o procedimento. Se perguntarmos à população o que é uma PCH, é duvidoso que 10% saiba responder. Para obtermos um julgamento realmente favorável à construção da usina — ou a sua negativa — será necessário uma ampla divulgação, não somente na cidade, mas principalmente nas comunidades do interior, onde se encontra mais de 50% da população local, e onde será implantada a usina. Sem esse consentimento consciente, não se pode afirmar que o povo de Prudentópolis concorda com a instalação dessas obras.

Observemos o que aconteceu em 2001, quando uma empresa canadense – Brascan tentou implantar uma PCH no salto São João. Um grupo de cidadãos de Prudentópolis, que tinham trânsito na prefeitura, participaram de reuniões de representantes daquela empresa com a administração municipal, e foram bem informados sobre os procedimentos. Em seguida, estiveram na reunião pública ocorrida na Câmara Municipal, onde apanharam inúmeras contradições entre os dois discursos dos usineiros — um na prefeitura, outro na sessão pública. Ficou evidente que haveria um grande impacto na cachoeira e no seu entorno, e que o retorno financeiro, ambiental e social proporcionado por aquela empresa ao município não estava à altura dos estragos previstos. Após aquela reunião, a empresa abandonou o projeto.

O mesmo procedimento contraditório tem-se verificado nas reuniões públicas que vêm ocorrendo desde 2011. A equipe técnica não conseguiu contradizer o discurso daquele promotor de Maringá. E o fato de que uma das empresas proponentes, Santa Clara, possui mais de 200 protestos em cartório, é evidência de que algo muito errado está ocorrendo nesse projeto — ainda que esse detalhe não se refira a questões ambientais. O empreendimento deverá ser de algumas dezenas de milhões de reais, e o recurso provavelmente virá do BNDS. Ora, como o governo poderá contratar com uma empresa economicamente instável como essa? Aliás, é difícil entender como se deu a tal empresa o consentimento para realizar estudos para a realização de obra dessa envergadura!

Também destacamos que durante as audiências públicas, em momento algum foi mostrado ao público presente o documento de Anuência Municipal para tal empreendimento.

6 – É evidente o baixo retorno econômico para o município e sua população

Nas reuniões públicas respectivas ao projeto Dois Saltos, os técnicos da Copel e da Santa Clara afirmaram que o município terá maior disponibilidade de energia elétrica, após a construção da usina. O promotor público de Maringá, supracitado, demonstrou que a energia será distribuída na rede elétrica, sem qualquer interferência na oferta energética local. Em 2001 o gerente regional da Brascan, João Coas, já havia informado publicamente que, após instalada, a usina do Salto São João não geraria dividendos para o município, e utilizaria somente um ou dois funcionários para o resguardo e a manutenção das máquinas. E que a energia extraída seria utilizada para equilibrar “os altos e baixos” da rede elétrica estadual.

Os representantes do projeto Dois Saltos disseram que serão geradas dezenas de empregos para a população local. O promotor público maringaense explicou que os empregos são dados a profissionais qualificados, que vêm de fora do município. Os técnicos também afirmaram que os materiais de construção serão comprados em Prudentópolis. O promotor evidenciou que as empresas proponentes buscam o melhor custo-benefício, comprando no atacado, de fornecedores de fora. Nesses quesitos, também não houve contestação pelos representantes dos proponentes, consentindo na veracidade das afirmações do promotor e evidenciando a pouca consistência no discurso daqueles técnicos.

7 – O impacto ambiental trará repercussões negativas no turismo do município

Prudentópolis tem-se destacado na mídia como um local excelente para o turismo rural e de aventura. Mas os turistas têm-se mostrado francamente decepcionados quando se deparam com as barragens, usinas e fábrica instaladas junto às cachoeiras do Rio dos Patos. Em função disso, cresce na comunidade a ideia de que se deve retirar as construções já existentes, devolvendo às cachoeiras seus cenários naturais. A mesma ideia foi partilhada pelo secretário de Meio Ambiente do Estado do Paraná, Jonel Yurk, em reunião na Câmara Municipal de Prudentópolis, no dia 11 de junho de 2012, junto a manifestantes contrários às usinas. Acrescente-se que a implantação de novas obras de concreto nesses locais dificultará ainda mais o processo de restituição dos cenários primitivos.

8 – A região abrangida pelo projeto é habitat de felinos de grande porte.

A lei Ambiental Brasileira, em seu artigo 29, parágrafo 1º, determina que o habitat dos animais selvagens deve ser preservado, e será imputada a “quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural”. A lei é ainda mais rigorosa quando se refere a animais raros ou considerados em processo de extinção, como as várias espécies de felinos selvagens.

Vários relatos apontam para a presença de felinos de médio e grande porte, na região que se estende desde o povoado de Manduri até a Linha São Sebastião, dentro da área de abrangência do projeto Dois Saltos. Não há registros fotográficos desses animais, porém os moradores referem-se a eles como “tigre” ou “onça”.

Intervenções na morfologia podem alterar a fauna, a flora e talvez algumas atividades turísticas que vinham se desenvolvendo na região, pois a paisagem é um recurso turístico por excelência. Por outro lado, alguns animais requerem extensas paisagens para manterem seu ciclo natural. O fracionamento ou a perda da paisagem pode afetar o padrão de movimento e o comportamento do animal dentro do seu ambiente natural. (do EIA-RIMA do projeto Dois Saltos)

Na última semana de junho de 2012, noticiou-se a presença de uma onça da Linha Paraná. O animal deixou sinais de sua passagem na propriedade da família Kapuchinski. Matou um porco e arrastou-o para o mato. “Era um porco vermelho, tinha uns 60 quilos”, disse o proprietário Miguel Kapuchinski. Alguns dias depois uma vaca foi atacada junto à residência de Miguel. O animal foi arrastado por cinco metros na direção do mato. Foi encontrado morto, com um furo de dois centímetros de diâmetro no pescoço e arranhões nas costelas. Pegadas de um felino grande foram encontradas nas trilhas em redor. Próximo ao rio Barra Bonita, além de arranhões em troncos de árvores, Sidinei Bruno de Oliveira, vizinho dos Kapuchinski, constatou o “cheiro forte da onça”.

Na Linha Piquiri, um morador diz ter escapado de um felino por um triz. Na descida próxima à igreja da Linha Paraná rumo à ponte do Perehouski, o filho de Paulo Vinharski foi atacado enquanto seguia em sua motocicleta. “O bicho se jogou na moto, quase pegou na rabeta”, diz Paulo.

No vale do Rio dos Patos, na Linha Tira Cisma, eu vi marcas das unhas de um felino de grande porte em árvores. (...) Obras de vulto nas áreas principalmente no vale do Rio dos Patos irá espantar de vez estes belos exemplares (...), uma pena... (Humberto José Sanches, em julho de 2012; engenheiro civil, da equipe de “apoio de campo” da Latec, empresa que elaborou o EIA-RIMA do projeto Dois Saltos). Observação: a Linha Tiracisma encontra-se na área de abrangência do projeto “Dois Saltos”.

Na região oposta ao Município de Prudentópolis, mas que margeia o Rio Ivaí, existem alguns felinos. Em imóvel que temos por lá, já escutamos urros noturnos que seriam de fêmeas em acasalamento. Achamos vestígios nas margens de um arroio próximo e proprietários das vizinhanças têm se queixado do desparecimento de porcos, cabritos, galinhas, etc. (Josué Corrêa Fernandes, historiador, ex-juiz de direito e ex-prefeito de Prudentópolis).

A presença de felinos topo de cadeia indica e justifica a permanência dos remanescentes florestais.

9 – As restrições na produção agrícola das áreas afetadas pelo projeto Dois Saltos trarão prejuízos ao município.

O projeto Dois Saltos prevê a desapropriação de 300 hectares de terras. Grande parte dessa área vem sendo cultivada pelos proprietários, que contribuem com o erário público de Prudentópolis. Como as terras desapropriadas deixarão de produzir, o município perderá parte significativa de sua arrecadação, resultando em prejuízo para toda a população.

10 - Conclusões

O artigo 9º do Plano Diretor Municipal – PDM de Prudentópolis, em seus incisos II e III, reza pela prioridade à conservação, recuperação e proteção ambientais. No artigo 22, parágrafo único, versa sobre as diretrizes de gestão ambiental como alavanca de desenvolvimento, na busca de soluções para áreas degradadas e preservação para as ainda não degradadas, indicando programas, projetos e ações para isso. Essa lei também prevê o tombamento, tendo como sujeitos os bens integrantes do patrimônio ambiental, histórico e cultural, entre eles os monumentos naturais. O artigo 73 assegura a participação dos cidadãos no processo de planejamento e gestão da cidade.

Em relação aos saltos Manduri e Visconde do Rio Branco, o tombamento se qualifica, pois ambos possuem valor sócio-cultural, ambiental, histórico, científico, estético, paisagístico, turístico e até arqueológico. O salto Manduri, por exemplo, recebeu o título de Balneário Municipal, através da lei 363, de 19 de junho de 1975 — outro fato não levantado pelo EIA do projeto Dois Saltos. Ora, como pode um local receber o título de balneário, e ter sua riqueza cênica e ambiental ameaçada?

Muitos dos pontos colocados no EIA Dois Saltos necessitam de leis específicas, que as regularize — o que ainda não foi feito. Outros necessitam de ações e diagnósticos para serem validados — o que também não foi feito.

Aqui vivemos nós, Prudentopolitanos, sendo parte deste ambiente tão particular e fascinante, e não precisamos perder o que temos, somente porque duas empresas decidiram aumentar seu faturamento!