sexta-feira, 13 de setembro de 2013

A VIDA ERA LOUCA

Rubens olhou a imagem no aparelho, um grupo de figuras desfocadas chutando um homem caído no meio da rua. A vítima já se encontrava completamente inerte quando veio uma última figura e chutou-lhe a cabeça. O locutor anunciava o crime e pedia justiça.
Rubens desligou o televisor e foi à cozinha. Encheu a chaleira d’água e depositou sobre o fogo. Despejou um pouco de água na panela de arroz, algumas gotas de óleo numa frigideira e levou tudo ao fogo. O relógio na parede apontava 19h15min. Apanhou os bolinhos, onde salientavam-se pedaços de cebola e salsa, jogou sobre o óleo fumegante. Enquanto a fritura chiava, abriu a janela e vislumbrou, entre os ramos desfolhados de uma parreira, uma ponta de céu tingida de estrelas.
Respirou fundo, como se preparasse um mergulho num lago desconhecido. Lá estava o extraordinário inalcançável, a imutável verdade cósmica! O que se transformava naquela imensidão era demasiado distante para que ele pudesse antever algo como redenção, ou outras promessas religiosas. As mesmas leis que regiam as estrelas elaboravam homens que se matavam nas ruas! A vida era louca, um evento inadmissível num universo feito de vazio e pedras, uma inconsistência no tecido aparentemente sólido da escura realidade.

Nenhum comentário: