segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

A BIGORNA E A CURA


Quando eu tinha dezoito anos vi, pela primeira vez, rapazes se tocando e se beijando num salão de danças em Curitiba. Achei aquilo bem estranho e fiquei realmente incomodado. Eu era preconceituoso? Sei lá!
Eu já tinha visto uns caras meio efeminados em Prudentópolis, mas nunca os visualizara aos malhos uns com os outros. O que eu sabia era que homens amavam as mulheres e vice-versa, mas homens amando homens era uma coisa muito nova. Até então eu só ouvira uns relatos pouco esclarecedores sobre o assunto. Se eu era preconceituoso, precisei estudar a questão para poder me consertar!
Antes que eu cristalizasse o preconceito em meu coração, vi-me morando numa casa de estudantes na capital, dividindo com 87 homens um prédio de quatro andares. Pelo menos cinco daqueles homens eram homossexuais. Eram homens tímidos, porém decentes, criativos, estudiosos, inteligentes, cultos, sinceros. Aprendi muita coisa com deles, porém nada relacionado a sexo. Em nenhum momento eles se insinuaram para o meu lado, nem tive com eles uma única decepção. Como confiavam em mim, vinham com frequência me contar seus dissabores. Um deles me disse que antes de deixar sua cidade, Lajes-SC, “quando batia a fissura”, isto é, quando sentia vontade de transar, sabendo que não podia atacar na sua região para não causar urticária nas “pessoas de bem”, viajava para o Rio de Janeiro. Foi então que compreendi o grande drama que essas pessoas vivem. Não gostam (sexualmente) de mulheres, gostam de homens, mas não podem correr atrás de seus objetos de desejo, porque nós, os fodões, os donos do mundo, os sacos-roxos da putaquepariu, nós rimos da cara dessas pessoas, nós os metralhamos, nós os matamos e exterminamos. Enfim, nós destruímos essas pessoas, e por quê? Tão somente porque eles representam um enigma que não conseguimos decifrar!
Você pode dizer que homens se beijando na praça “é uma nojeira”. Mas isso é realmente um problema deles, ou um problema seu, que não consegue entender o mundo dessas pessoas, ou não consegue virar o rosto para o lado e seguir andando para cuidar da sua própria vida?  Qual é a verdade? Onde está a resposta? Qual é, na escala da ciência, a diferença essencial entre o pirulito e a flor? São ambos elementos acessórios do sistema reprodutor humano! Homem e mulher são duas peças do mesmo sistema, e o pirulito e a flor só se tornaram esse terror em nossas mentes (não podemos nem mesmo dizer em público as palavras “pinto” e “buceta” para não chocar os caretas!) porque nós ainda somos um bando de patetas.
A natureza, mãe de tudo e de todos neste planeta, não reclama nem pune os homossexuais. Mas no meio social dois homens não podem esfregar seus corpos um no outro, porque assim determinam as regras sociais! Entendo. Mas você entende que todas — TODAS! — as regras foram feitas por pessoas, e que pessoas são seres envenenados por traumas, complexos, vícios, ódios, traições, rancores e tristezas de todo tipo? Se você quer metralhar e acabar com todos os gays do mundo, vá em frente. Mate-os todos! Mas o que isso terá mudado em você? Terá obtido a grande resposta para aquela bigorna que bate em sua cabeça todos os dias buscando respostas? Quem sou eu? Tóóóimmm! O que é ser um macho? Tóóóimmm! O que é despertar neste mundo louco, tomar consciência da própria existência, viver meia dúzia de décadas e desaparecer para sempre? Tóóóimmm! Quem vai curar essas suas dúvidas?

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