quinta-feira, 29 de outubro de 2009

CAPUCCINO

A moça mostrava uma eficiência tão grande, tanto charme enquanto preparava o capuccino, que a gente quase se apaixonava por ela. Misturava no liquidificador o leite em pó e o café solúvel. Despejava a mistura num recipiente com tampa e acrescentava vários outros ingredientes misteriosos, como o bicarbonato e a canela. Mexia aqui, tirando o café expresso dali, derramando a nata fria e o pó de chocolate sobre toda aquela delícia expresso dali, derramando a nata fria e o pe se apaixonava por elaaralela, que jmo tamb. Nos próximos três ou cinco minutos, sorvendo aquele aroma e sabor únicos, parecíamos estar em Paris, no pós-guerra, sentindo toda a força humana convergindo para a reconstrução do Velho Mundo.

Dez ou quinze anos depois mudou a moça, e também a receita. Ninguém mais tem tempo de preparar um capuccino artesanal, por isso ele já vem pronto na latinha. A moça não tem preparo, joga muito pó e fica aquela meleca por baixo de um chantily de péssima qualidade.

Em toda parte estão-se perdendo os profissionais, os artesãos, em troca de produtos elaborados na indústria. Quase ninguém sabe fazer mais nada, senão vender o produto pronto. É mais ou menos isso que vemos também na música.

Eles não são medíocres. Se fossem, estariam na média, mas eles estão muito abaixo da média, embora eles sejam a mídia, os meios através dos quais passam todos os sucessos do Brasil. Eles são o nosso maior fracasso.

Há mais de 20 anos agüentamos a Xuxa, o Faustão e o Gugu, esses criadores da cultura enlatada brasileira. Eles não têm idéia do mal que fazem à nação, e talvez os diretores das emissoras onde eles pregam seus evangelhos de consumo também não saibam.

Há um Brasil explodindo de criatividade aqui fora da telinha, compositores fantásticos, artistas extraordinários criando uma cultura — não alternativa, pois isso parece coisa de bandido — mas uma cultura paralela, que já começa a vazar pelas tampas e está invadindo a internet. Em breve a turma da indústria cultural não conseguirá segurar o rojão e veremos a cultura do Brasil invadir a televisão, como nos velhos e bons tempos.

Quem sabe também volte a moça do capuccino com sua receita misteriosa.

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