Quando eu era garoto, li o conto do menino índio
que foi ao pajé e perguntou:
— Mestre, é a coragem o maior dom de um
guerreiro?
— Não, gafanhoto. O maior dom de um guerreiro é
a juventude.
Fiquei decepcionado com o pajé e sua resposta
aborrecida. Um pajé de verdade jamais diria tal asneira! Aos doze ou treze anos
eu estava transbordando de juventude, e não achava aquilo uma grande vantagem.
Queria ficar velho depressa para poder entrar no cinema e assistir a todos os
filmes proibidos para menores de quatorze!
Creio que o autor da história do pajé já estava
contaminado por antecipação com essa velocidade midiática que nos devasta.
Somente um corpo jovem seria capaz de usufruir os produtos que passam. E a
coragem, de que serviria nestes tempos de perigos mínimos?
Os anos se foram, minha juventude restou
impressa em finos retângulos de papel que guardo numa caixa de sapatos, mas
ainda vejo a coragem como um espírito raro, manifesto nas manhãs de terremotos,
nas tardes de vendavais e nas noites de política. A juventude continua
transbordando, nas escolas, nos bares, nas repartições públicas, nas
manifestações contra a falta de reposição salarial, mas basta o bicho bater o
pé e a juventude corre para debaixo dos tapumes, ou para o conforto daqueles
que já não possuem juventude.
Um pastor religioso diria que o maior dom da
vida é a fé. Mas continuo apostando na coragem. É preciso de um bocado de fé
para se ter coragem, mas qualquer medroso pode demonstrar uma fé profunda.
A coragem não é só um instrumento para a
realização da justiça. A coragem é, acima de tudo, um dom e uma recompensa.
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