sábado, 11 de maio de 2013

OS BONS TEMPOS DA BATATA

A febre da batata teve início na colônia Gonçalves Júnior, distrito de Irati-PR, a partir de 1930. Nessa época a situação de muitos imigrantes ainda era precária, devido principalmente à dificuldade de comercialização de seus produtos. Entre eles, a batata, que era vendida de casa em casa.
Numa noite de 1930 os alemães de Gonçalves Júnior encontravam-se em fervoroso debate na Cooperativa Teutônia. Buscavam soluções para a batata, que produzira bem naquele ano, porém, muitos agricultores haviam retornado da cidade de Irati com as carroças repletas, terminando por jogar os tubérculos aos porcos. No auge da discussão chegaram Franz Scholte e Fritz Ortlepp. Ex-construtores de hidrelétricas da Light, em São Paulo, tinham acabado de se instalar na colônia, quando foram convidados por Frederico Koch a participar da reunião na cooperativa.
Fritz Ortlepp nasceu em Sohl, cidade sede de fábricas de armamentos da Alemanha durante a I Guerra Mundial. Conforme sua sobrinha, Mariana Scholte, nascida em 1919, ele “não entendia nada de lavoura”. Porém, intrigado com os problemas dos agricultores, sugeriu levar a batata para São Paulo, que estava na entressafra do produto. Inicialmente os colonos discordaram, pois não conseguiam imaginar uma viagem de carroça a um local tão distante.
A reunião acabou com Fritz comprometido a fazer o intercâmbio com os atacadistas paulistanos. Dias depois seguiu de trem, acompanhado de um dos líderes de Gonçalves Júnior, rumo a São Paulo. Chegando ao Mercado Municipal, Fritz negociou com um comprador um preço exageradamente maior que o praticado em Irati. No dia seguinte, de manhã, havia dois mercadistas de olho nos trilhos, à espera dos dois vagões de batata prometidos. Para surpresa geral, o colega de Fritz havia vendido a mesma carga a um segundo mercadista. Principiou um tumulto, os compradores chamaram a polícia. A autoridade conseguiu abrandar a situação sugerindo que cada comprador ficasse com somente um vagão. O acordo foi selado.
Eufóricos com a notícia, lavradores de todos os cantos de Irati começaram a plantar batatas. Na safra seguinte Fritz já se havia tornado presidente da Teutônia, e nem precisou deslocar-se a São Paulo para vender. A partir daquele ano, atacadistas paulistanos, em sua maioria descendentes de espanhóis, vieram pessoalmente a Irati e passaram a incentivar o cultivo da batata. “Com uma comercialização inteligente, tornaram-se intermediários e os incentivadores da cultura em Irati, até esta atingir o galardão de maior produtora de batata inglesa do Brasil”, segundo Osinski. Em 1935 o Município vendeu quase nove mil toneladas do produto, contra duas mil toneladas de erva-mate e 500 toneladas de feijão. Em 1938 a produção de batata subiu para 14 mil toneladas.

DECLÍNIO
A batata ganhou tal importância na economia de Irati, que tornou-se imperativo zelar pela qualidade do produto “exportado”. A partir de 1938 a Prefeitura instalou “postos de inspeção” nos distritos, onde eram expedidos certificados a serem apresentados aos compradores. A Cooperativa Teutônia construiu um depósito na cidade, próximo ao Cemitério Municipal. Porém, vários empresários locais também passaram a mandar o produto para São Paulo, a cooperativa entrou em decadência e o depósito se transformou em albergue.
No final da década de 1940 surgiu a pinta preta, que dizimou os batatais. “Foi um golpe muito forte. Não sobrou batata sadia nem pra semente. Os jovens começaram a se mandar para a cidade” (Osvaldo Körtelt, agricultor e cronista, 2007). Enquanto os agricultores locais penavam com o empobrecimento do solo e as pragas da lavoura, uma cooperativa de japoneses instalada próximo à capital paulista ganhava força na produção. Apesar dos atacadistas preferirem a batata de Irati, por ser produzida numa terra descansada, sem adubo e mais barata, a nascente Cooperativa Agrícola de Cotia acabou ganhando o mercado paulistano.
Os iratienses começaram a sentir a crise, que se estenderia por várias décadas. O Município de Irati passa no momento uma fase angustiante de vida. O comércio está paralisado. A lavoura desorientada. A indústria, com raras exceções, asfixiada por falta de meios de expansão (Campo e Roça, 1950).
O agricultor de Irati teve dificuldade em adaptar-se à nova realidade da agricultura mundial, que se mecanizava e adotava fertilizantes e corretivos de solo. Não temos encontrado meios práticos para irmos em socorro do lavrador, que dia a dia chafurda num ambiente precaríssimo de higiene e num desânimo conseqüente a enorme atividade em troca de uma colheita pouco remunerada (João de Mattos Pessôa, em 1956, citado em Irati I, 1972).
No final da década de 1950 o preço da batata foi multiplicado por oito. Foi todo mundo plantar batata. E até eu, que tinha bastante terreno disponível, resolvi plantar também. No ano seguinte houve uma supersafra e São Paulo não queria batata nem de presente. Aí foi aquele desespero. Os bancos apertando e ameaçando tirar as terras. (João Mansur, Hoje Centro Sul, 2007). Representante de Irati na Assembléia Legislativa, Mansur convenceu o governador Moysés Lupion a comprar toda a safra, que foi enviada ao Norte do Paraná.
Nesse período várias instituições estaduais e federais orientavam os lavradores: Casa Rural, Fundação de Assistência ao Trabalhador Rural, Posto Agropecuário, Escola de Tratoristas e Associação de Crédito e Assistência Rural do Paraná, Acarpa, atual Emater. Também instalou-se a Comissão de Abastecimento e Preços do Paraná, que passou a adquirir a produção local. Porém, na década de 1960 a batata ainda era uma questão aberta. Em 1965 houve nova superprodução e grandes prejuízos. Na verdade a batata-inglesa iratiense só tem preço e mercado quando outras áreas deixam de produzir (Correio do Sul, fevereiro de 1965).
(Texto publicado no livro “Irati 100 Anos”, lançado em 2008)

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